quinta-feira, 10 de novembro de 2011

As entrelinhas do caso USP

Impossível não imaginar como seria o tratamento dado pela mídia ao episódio envolvendo estudantes da Universidade de São Paulo (USP), presos por usarem maconha dentro das dependências da instituição, se o evento tivesse ocorrido em alguma universidade do Nordeste. Depois que três jovens foram abordados e conduzidos à delegacia no último dia 27, várias manifestações se sucederam e tem colocado a renomada Universidade no cenário de polícia. São 14 dias de greve, audiências, assembleias e nenhuma definição.

- Baderna e violência.

- Estudantes da Universidade...presos por uso de drogas e atos de vandalismo.

Utilizo as frases acima para representar uma possível escalada de abertura de um jornal nacional, quero dizer, de um noticiário de abrangência nacional, e não, necessariamente, de um Jornal Nacional, com iniciais maiúsculas, caso o episódio tivesse sido aqui, na Bahia, por exemplo.

E para o Sudeste, para a USP, instituição renomada, repito, pelo seu histórico de ostentar dentro dos seus muros, hoje nem tão sólidos, os melhores e mais organizados estudantes do país, exemplos a serem seguidos por todo o Brasil, incluindo, exclusivamente, o Nordeste...

- Universidade Federal de São Paulo.

- Estudantes manifestam contra atuação violenta da polícia.

A inversão de adjetivos e transformação de interpretação de ações é, no mínimo, muito interessante. Uma corrida rápida pelos principais jornais da região onde está situada a USP mostra-nos, de imediato, a escolha cuidadosa no uso de algumas palavras ou expressões, e a quem coube a honra de conjugar verbos com carga negativa.

Dentre tantas construções, chamou-me a atenção para destacar aqui a seguinte frase, postada em um jornal nacional, com iniciais minúsculas, vale relembrar, mas que não vem ao caso citar o nome. “Os estudantes que estão na ocupação não permitem que a imprensa filme ou fotografe as assembleias”. No mínino, essa simples e ingênua frase renderia uma tese sobre as diferenças de semântica entre as palavras “ocupação” e “invasão”, essa última tão naturalmente empregada por alguns veículos grandes de comunicação quando se trata de uma manifestação de movimentos sociais, para exemplificar. Ainda sobre a frase, estranhei não ter suscitado um amplo debate sobre liberdade de imprensa, o que, salvo engano, seria natural pela conduta que se observa da grande mídia diariamente.

Outro debate inevitável, que renderia aí, por baixo, umas duas semanas de assunto para a mídia, e que passou despercebido (penso), seria a partir do e-mail enviado por um estudante à presidente Dilma, onde solicita o lançamento do “Bolsa Maconha”. Ao que me parece, nesse caso, para a mídia, o Bolsa Família, programa do Governo Federal, que deve ter alimentado a imaginação desse estudante, seria positivo. Só nesse caso!

Resta, ainda, os “revolucionários”. Foi o nome mais carinhoso, digamos, que os jornais conseguiram para se referir aos estudantes grevistas, do Sudeste, da USP. Se no Nordeste, vândalos seria, automaticamente, sinônimo. Finalizo estes lances de reflexão com a interrogação de Diana Assunção, diretora do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp): “Prenderam e levaram para a delegacia um estudante que consumia maconha. Não se pode criminalizar o usuário na rua, mas dentro da universidade pode?”.

Dentre tantas possibilidades de interpretação, uma preocupação é visível nos depoimentos do reitor da USP, João Grandino Rodas: a Universidade de São Paulo tem muito o que preservar  e isso está além de um simples debate de proibir ou não proibir. Ainda há de sair muita fumaça dessa história.


Josevaldo Campos